Assim nascem os textos... Sem avisar... Bater na porta, ou mandar recados... Não se mostram, apenas chegam, e chegando não findam... São perenes, reais e eternos...

Por: Beth Brito

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

Não se assuste! Lute.

Recebi um telefonema de uma senhora, que me deixou surpresa... Isso foi à semana passada... Ela pedia encarecidamente que ensinasse seu filho a escrever...

- Mas minha senhora – desculpei-me, eu não sou professora de português.
- Eu sei, por isso mesmo, os professores não têm conseguido muito.
- A culpa não é deles, a falha é no ensino – falei!
- Pode ser, mas gostaria que a senhorita ensinasse meu menino... A senhorita escreve bem!
- Obrigada – agradeci, mas não acredite muito nisso. Não coloco vírgulas e nunca sei onde botar os acentos. A senhora precisa ver o trabalho que do ao revisor dos “meus escritos”.
- Não faz mal – insistiu a mãe – a senhorita vem e traz seu revisor!
- Não dá minha senhora – pedi desculpas novamente, não tenho o menor jeito com crianças, e o meu revisor anda muito ocupado com os projetos do “Nós Pós”.
- Nós o quê? E quem falou de criança? Meu filho tem 18 anos!
- Ah! Mas mesmo assim senhora, não posso, tente ver outra pessoa, e agora tenho que desligar, pois tem gente aqui tocando a campaia... Bom dia.


No dia seguinte comentei o fato com um professor amigo meu, que me respondeu: “Você não deve se assustar, os jovens estudantes brasileiros não sabem escrever”... Depois de dois dias, ouvi de outro educador: “Os alunos da atualidade escrevem muito mal”... No outro dia pela manhã li no jornal uma nota de um Diretor de faculdade: “O estudante Universitário não escreve bem”...
Impressionada, saí à procura de outros educadores e todos me disseram: “Acredite, o estudante de agora não escreve mais como os de antigamente”. Depois dessas tantas observações, passei a analisar e notei: Ninguém faz mais diário, nem escrevem mais em portas de banheiro, nem na areia da praia, nem em paredes... Não tenho visto nem aquelas inscrições, geralmente acompanhadas de um coração, feitas em casca de árvore... Bem, na verdade eu não tenho visto nem árvores...
Passados alguns dias, encontrei-me com um amigo jornalista do ‘Diário de Pernambuco’, nos esbarramos nos corredores de livros da ‘Livraria Cultura’... Conversamos e interessante: Paramos na mesma conversa do telefonema:

- Você concorda que o estudante de hoje não sabe escrever?
- Sim. E isto é ótimo para mim. Pelo menos diminui a concorrência e me garante emprego por mais dez anos, - disse Rudá eufórico!
- Engano seu, - falei – a continuar assim, dentro de cinco anos você terá que mudar de profissão.
- Por quê? - Espantou-se! Quanto menos gente sabendo escrever, mais chance eu tenho de sobreviver. – Continuou Rudá com tom egoísta!
-E você? Arrisca um palpite do porque essa geração não sabe escrever?
- Sei lá – deu com os ombros -, vai ver não sabem pegar no lápis! – Ironizou e sorriu Rudá.
- Não senhor, - retruquei! Não sabem escrever, pois estão perdendo o hábito da leitura. E quando o perder completamente, você ‘Rudá’ irá escrever para quem?

Tai um dado novo que ele não havia considerado. Imediatamente nos sentamos numa mesinha redonda no primeiro andar da livraria, e viajamos ao futuro que não tardará chegar...

- Que utilidades teria um jornal nesse futuro imaginário? – perguntei à Rudá.
- Acho que embrulhar carnes! Então vou trabalhar num açougue! – Rimos...
- Serviria para fazer barquinhos, fogueiras nas arquibancadas do ‘Sport Clube do Recife’, para forrar sapato furado, limpar espelhos e ainda quebrar um galho nos banheiros de estrada... – E ele falava olho no olho...


Imediatamente, Rudá imaginou-se com uns textos na mão, correndo pela Av. Caxangá, Agamenom, Abdias... Oferecendo às pessoas, assim como quem oferece hoje bilhetes de loteria:

- Por favor, amigo, leia! – puxando um cidadão pelo braço...
- Não, obrigado. Não estou interessado. Nos últimos cinco anos a única coisa que ainda leio é bula de remédio tarja preta! – dizia o homem...
- A senhorita não quer ler? – perguntarei acompanhando os passos da universitária – a senhorita vai gostar, é um texto muito curioso!
- O senhor só tem escrito? Então não quero! Por que o senhor não grava o texto? Anote meu e-mail e me mande! Fica mais fácil ouvir em meu MP3000... Se gostar, posso até comprar outras gravações... – e a moça se foi...
- E o senhor, não está interessado nuns textos?
- É sobre o quê? Ensina a ganhar dinheiro? - mais uma tentativa frustrada.
- E o senhor vai? Leva três e paga um!
- Deixa-me ver o tamanho? – pediu o homem.
- Nossa! Assustou-se com o tamanho do texto:
- O quê! O senhor está pensando que sou um vagabundo? Que tenho tempo para ler tudo isso? Não dá pra resumir tudo em cinco linhas? – gritou outro cidadão...

Eu e Rudá gargalhamos alto, e os olhares se voltaram para nós...

- Vamos Rudá? Vou tentar ensinar o ‘menino’ a escrever melhor...
- E eu reviso! – disse Rudá desesperado.


Beth Brito
2009

Um comentário:

  1. Muito interessante o devaneio sobre o não saber escrever de nossos jovens (por não gostarem de ler) e sobre o futu da leitura...

    Parabés pelo blog, Beth.

    Tudo aqui é muito como imagino você: róseo e profundo.

    Xerinho!

    P.S.: Não pude deixar de ficar curioso em saber quem é seu revisor, o que "anda muito ocupado com os projetos do “Nós Pós”". rsrs

    Xerinho de novo!

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